terça-feira, 29 de junho de 2010

Sempre esqueço os títulos

Estava sentada no ponto de ônibus daquele lugar que a muito não ia, com um certo gosto de tristeza e melancolia. Esperava por algo, por alguém, por algum acontecimento que a levasse direto pra casa. Já passava de meia noite, pai e mãe me esperavam em casa sem ter notícias a horas. Aliás, apesar da presença diária já não tinham notícias minhas a tempos.
Mas hoje, acordei farta. Farta de me esforçar, farta de me empenhar. Farta de tudo aquilo que não fazia sentido. E do que fazia também. Então, saí de casa e peguei um ônibus pro lugar mais perto da minha infância, onde foram vividos longos tempos felizes, sentei em um ponto de ônibus abandonado em frente a um velho parquinho, e voltem alguns anos no tempo só pra ver o brilho nos olhos que eu havia deixado pra trás. Foi bom. E garanto, a quem quiser e a mim mesma que quando os ventos frios pararem de soprar, eu voltarei, mais quente do que nunca.

domingo, 20 de junho de 2010

A Procura da Poesia

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

(Carlos Drummond de Andrade)

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Vai ver o bem que faz...

... Quando é você que se permite.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ascendência e Decadência

Parece que quando as coisas estão muito boas, elas tendem a ficar proporcionalmente muito ruins. Pode reparar, mais cedo ou mais tarde isso acontece. Eu sei, eu sei, pessimismo é para os fracos, mas o fato é que quando você pensa que nada pode piorar, pum! As coisas acabam piorando.
Mas, se ainda tenho forças para resgatar o otimismo que vive latente dentro de mim, escondo meus sentimentos (quaisquer que eles fossem) e sigo em frente. Afinal, ele é a minha arma mais forte desde sempre.

domingo, 6 de junho de 2010

Outono

Enquanto ele me contava suas histórias de quem quer se gabar (e deu pra perceber que ele gosta mesmo disso) eu ficava imaginando a situação louca que eu acabei me metendo. Mas não me arrependi, não mesmo. Quando ele começou a falar empolgado daquilo que tanto lhe interessava, eu desviei o assunto com um BLÁ BLÁ BLÁ BLÁ de desinteressada, enquanto via a raiva e o encanto no seu rosto.
- Ah é? - Disse ele com um tom de ameaça.
- HUM? HUM? - Eu disse enquanto prendia um gargalhada.
- Ah é? - Ele repetia enquanto chegava mais perto.
- É. - (Não me lembro a última vez que falei um "é" com tanta segurança).
E então, ele me puxou num beijo no meio da rua.
- Então é. - Eu sorria mais uma vez.
Sorria mais uma vez. Dá pra acreditar?
Talvez não valha a pena continuar pensando. Talvez ele mesmo nem valha tanto quanto eu posso estar pensando. O que eu sei, com certeza, é que na próxima estação eu o verei de novo.